Professores, acordem! Uma crítica ao texto de Gustavo Ioschpe na revista Veja

Professores, acordem! Uma crítica ao texto de Gustavo Ioschpe na revista Veja

Hoje escrevo sobre educação para comentar o artigo presente na revista Veja do economista, administrador e cientista político Gustavo Ioschpe. Ele é especialista em educação.

Em seu texto na veja da última semana ele fez duras críticas aos professores. Em minha opinião elas são razoáveis, mas alguns pontos precisam ser esclarecidos.

Quero lembrar que trabalho diretamente com educação, tanto no âmbito administrativo como educacional. Sou administrador, bacharel e licenciado, e especialista em gestão pública. Apesar de escrever costumeiramente sobre economia e finanças neste espaço minha área de maior atuação é a educacional.

O que segue abaixo são trechos do artigo do Ioschpe (em vermelho) seguidos de comentários meus:

educacao

Faço isso, em primeiro lugar, porque creio que a educação brasileira só vai avançar (e com ela o Brasil) quando houver demanda pública por melhorias.

Creio que a demanda não seja apenas pública. As famílias precisam entender que a educação começa em casa. A educação social é tarefa dos pais cabendo ao professor à educação formal. Infelizmente pais atribuem hoje ao estado e ao professor a responsabilidade pela educação holística dos seus filhos, mas eles esquecem que a educação se inicia no lar e que seu sucesso é um contínuo que começa nos primeiros meses de vida da criança e vai até a idade madura.

A culpa pela existência de um cidadão mal educado que joga lixo no chão e destrói patrimônio público e privado é mais dos pais que não educaram na tenra idade o filho do que do professor ou do Estado.

O discurso é sempre o mesmo: o professor é um herói, um sacerdote abnegado da construção de um mundo melhor, mal pago, desvalorizado, abandonado pela sociedade e pelos governantes, que faz o melhor possível com o pouco que recebe.

Tenho que concordar com Ioschpe de que este discurso já cansou. Eu digo ao professor que discorde para pegar seus livros e giz e buscar outra colocação no mercado.

Caros professores: vocês se meteram em uma enrascada. Há décadas, as lideranças de vocês vêm construindo um discurso de vitimização. A imagem que vocês vendem não é a de profissionais competentes e comprometidos, mas a de coitadinhos, estropiados e maltratados.

Infelizmente ele tem razão novamente. Nós professores nos fazemos de vítimas. Muitos, e não posso dizer que seja uma minoria, são mal preparados e, portanto incompetentes. São docentes simplesmente por ser a única porta que se abriu para eles. São professores por não serem capazes de conseguir remuneração melhor em outra função.

Recentemente destinamos os royalties do pré-sal a vocês, e, em breve, quando o Plano Nacional de Educação que transita no Congresso for aprovado, seremos o único país do mundo, exceto Cuba, em que se gastam 10% do PIB em educação (aos filocubanos, saibam que o salário de um professor lá é de aproximadamente 28 dólares por mês. Isso mesmo, 28 dólares. Os 10% cubanos se devem à falta de PIB, não a um volume de investimento significativo).

Já neste ponto o articulista da Veja viajou.

Quanto ao PNE destinar 10% à educação também não concordo, mas por uma questão técnica. Qualquer administrador sabe que não se deve especificar um valor porcentual a uma área específica, e sim os recursos necessários com vista ao cumprimento dos objetivos traçados. Valores porcentuais apenas geram gastos burros.

Agora não podemos afirmar que 10% seja muito porque pais nenhum do mundo destina este porcentual para a educação. Uma coisa é o Japão que em 2011 gastou 3,5% do PIB com educação e outra é o Brasil. Primeiro que o PIB per capita japonês é mais que três vezes o brasileiro; e segundo que lá toda a infraestrutura está pronta, e é meio óbvio que manter é muito mais fácil que construir. No Brasil precisamos construir escolas e toda a infraestrutura para elas funcionarem e isto demanda muito mais dinheiro.

Comparar valores percentuais do PIB é ingenuidade. Talvez manipulação estatística para encontrar argumentos que corroborem com uma visão enviesada.

Vocês foram gananciosos demais. Os 10% do PIB e os royalties do pré-sal serão a danação de vocês. Porque, quando essa enxurrada de dinheiro começar a entrar e nossa educação continuar um desastre, até os pais de alunos de escola pública vão entender o que hoje só os estudiosos da área sabem: que não há relação entre valor investido em educação — entre eles o salário de professor — e o aprendizado dos alunos. Aí esses pais, e a mídia, vão finalmente querer entrar nas escolas para entender como é possível investirmos tanto e colhermos tão pouco.

Vamos com calma. Somente mais dinheiro não é a solução. Gerir corretamente este dinheiro é fundamental para o sucesso.

A educação brasileira só irá avançar quando todos (pais, professores e o estado) entenderem que ela é uma construção coletiva. Os saudosistas afirmam que a escola pública em 1970 era muito melhor, mas se esquecem de falar que os pais suportavam os professores e ainda o educar-se era uma ação deliberada. Hoje ela é coercitiva. Não há professor que seja capaz de educar quem não queira ser educado. Você pode disponibilizar todo o dinheiro do mundo que isto nunca vai acontecer. A mudança é cultural e não somente financeira.

Há sim uma relação entre o valor investido em educação e o aprendizado dos alunos. Só que somente o investimento financeiro não traz resultado sem mudança de paradigma. A educação brasileira precisa de profundas mudanças. Nossas escolas doutrinam e não educam. Volto a apontar a necessidade de uma mudança cultural, precisamos repensar a educação de uma forma integrada e interdisciplinar. Paulo Freire e Karl Marx dominam a ideologia educacional brasileira. Suas teorias fracassaram. Vamos repensar?

Vão descobrir que a escola brasileira é uma farsa, um depósito de crianças. Verão a quantidade abismal de professores que faltam ao trabalho, que não prescrevem nem corrigem dever de casa, que passam o tempo de aula lendo jornal ou em rede social ou, no melhor dos casos, enchendo o quadro-negro de conteúdo para aluno copiar, como se isso fosse aula. E então vocês serão cobrados. Muito cobrados. Mas, como terão passado décadas apenas pedindo mais, em vez de buscar qualificação, não conseguirão entregar.

Realmente muitos professores são uma farsa. Alguns não leem um livro há anos. Estão muito longe de entender o que venha a ser uma aula. Muitos não sabem nem mesmo usar um computador. Mas lembro de que os livros e cronogramas vêm de cima. Somos obrigados a rezar na cartilha do governo. E se não o fazemos somos punidos.

Existem muitas coisas que vocês precisarão fazer, na prática, para melhorar a qualidade do ensino…

É fato. O professor é parte da mudança, mas é incapaz de fazê-la sozinho. A educação é um problema grasso e precisa ser encarrada de frente por todos como a única forma de avançarmos rumo às mudanças que o Brasil precisa.

Gustavo Ioschpe fala muitas verdades, mas em minha análise comete o mesmo erro que os professores, estes ao atribuírem toda a culpa ao governo e ele ao atribuir toda ela aos professores.