Herança maldita: o péssimo hábito de consumir do brasileiro.
Quem tem 30 ou mais anos viveu num Brasil de hiperinflação. Inflação que corroía o poder de compra de qualquer assalariado. Inflação na casa dos 50% ao mês, isto mesmo, ao mês.
A criação do Real em 1994 é um divisor de águas na política econômica brasileira, ele nasceu desacredito, afinal já eram tantos planos mirabolantes que os brasileiros nem acreditavam mais numa economia com inflação sob o mínimo controle. Mas ele deu certo e estagnou a hiperinflação e vivemos hoje num país com inflação controlada.
Eu me lembro como era engraçado viver com hiperinflação. Produtos eram remarcados nos supermercados todos os dias, às vezes mais de uma vez ao dia. A regra era conhecida de todos: recebeu o salário vá às compras. Na manhã seguinte ao dia de pagamento íamos todos ao supermercado, havia filas antes mesmo da abertura das portas, todo mundo queria comprar, estocar alimentos e proteger o salário do poder corrosivo da inflação. Em alguns momentos estávamos fazendo as compras e os marcadores vinham remarcando os produtos, alguns eram bacanas e alertavam:
– Pega logo que vou remarcar.
Na época, eu adolescente, apenas acompanhava minha mãe às compras, e confesso que sem muito entender o significado de tudo o que acontecia me divertia com a situação.
Foram inúmeros os planos que sugiram como solução para conter a inflação, mas com uma máquina administrativa inchada e que gastava além da conta nenhum deu certo. O mais maluco de todos foi o plano Collor que bloqueou o dinheiro aplicado na caderneta de poupança prometendo devolvê-lo depois de 18 meses e em parcelas. Foi uma loucura. O presidente mais odiado será sempre lembrado por esta politica doida, mas sejamos justos, foi graças a algumas de suas medidas como presidente que o Brasil pode avançar: ele acabou com a reserva de mercado, iniciou as privatizações que continuaram no governo Itamar e aceleraram-se no FHC e reduziu tarifas de importação. Medidas que permitiram a indústria brasileira se modernizar e assim avançar.
Quem tem menos de 30 anos não se lembra de nada disso. Mas é parte da história do Brasil.
De tudo isto ficou uma herança maldita: o péssimo hábito de consumir do brasileiro. A inflação nos fazia ganhar e gastar. Não havia tempo para refletir, pois se você esperasse o dia seguinte já pagava mais caro. Hoje a realidade é outra, o brasileiro pode programar racionalmente as compras, comprar o necessário e quando estiver com bom preço. Mas infelizmente o mau hábito está impregnado em nosso DNA, são poucos os que conseguem agir racionalmente e gastar menos do que ganham e viver uma vida financeira menos impulsiva.
Sempre falo que gastar é bom demais. A sensação de ir às compras e torrar dinheiro é maravilhosa. Mas é possível fazer isto de maneira programada, estabelecendo o limite mensal que se pode gastar.
A geração dos mais de 30 tem a desculpa de estar contaminada pelo ganhar e gastar. Já a nova geração, aqueles que nasceram com o plano Real, não sabem o que é inflação. Nasceram num Brasil estável, num país de economia que vem se solidificando rumo à seriedade. Estes jovens farão em 2012 18 anos, serão maiores de idade. Estão começando a trabalhar e a estudar para a profissionalização, seja através de cursos superiores, técnicos ou profissionalizantes.
Você é um privilegiado. Além de uma economia que lhe permite programar e fazer escolhas vive numa era de alta tecnologia, de informação na ponta dos dedos. Informação democrática e acessível à maioria. A decisão é toda sua, a estabilidade econômica e a democratização do conhecimento lhe permite ser o condutor de seu próprio caminho.
Eu sei, seus pais que conheceram um Brasil de políticas econômicas esdruxulas vão lhe trazer alguns argumentos que devem sim ser ouvidos, mas apenas como história, o Brasil que eles falam ficou no passado, não existe mais. O que nós, cidadãos conscientes, devemos fazer é ficarmos atentos para nunca mais deixar este velho Brasil acordar. É obrigação nossa sermos responsáveis financeiramente e politicamente. Financeiramente para gastar menos do que se ganha e investir o excedente buscando a independência financeira, e politicamente para votarmos com seriedade, estudando cada candidato e escolhendo o melhor para o país. Note que eu disse para o país e não meramente para as minhas necessidades pessoais.
2012 começa e temos a oportunidade de fazermos diferente, de começar no plumo certo. Se você já está no rumo correto meus parabéns, este texto serve apenas como um reforço, um estímulo para você continuar. Mas caso este não seja o seu caso, aproveite o bom momento brasileiro, construa uma carreira sólida, viva uma vida frugal e com responsabilidade financeira.
A chamada geração Y é uma geração afoita que busca resultados rápidos. Cuidado. É fundamental primeiro estabelecer a ética a seguir para depois traçar planos. É importante ouvir os mais velhos e aprender com eles.
Você com menos de 30 anos provavelmente viverá muito, passará dos 90, chegará aos 100 anos. Então para que pressa?
A “Aposentaria” irá se aposentar em breve. Na era do conhecimento não existirá aposentados, as pessoas devem ser produtivas sempre. O ritmo diminui, mas não se para nunca.
Este novo mundo exige um novo pensar, novos paradigmas. As velhas regras já não são mais válidas e novas estão sendo construídas.
Boa semana!